Escrita por: Pedro Rubens
Esse texto possui spoilers sobre alguns dos eventos da nova temporada.
Recentemente, um determinado vídeo viralizou na internet no qual jovens com o mesmo nome possuíam o mesmo “cargo”, todos herdeiros. Vez ou outra é possível ouvir alguém fazer piada sobre nepo babies e, a partir daí, criam-se outras nomenclaturas que terminam falando sempre sobre a mesma situação: herdar algo de alguém. Mas e quando, dentro do universo audiovisual, a herança é um legado que está prestes a ser jubilado?
The Acolyte, nova série do universo de Star Wars, nos leva de volta ao período mais remoto no qual já temos conhecimento. A história apresenta aos espectadores a uma galáxia de segredos e poderes emergentes do lado sombrio da força nos últimos dias da Alta República. Uma ex-Padawan se reúne com seu Mestre Jedi para investigar uma série de crimes, mas as forças que eles enfrentam são mais sinistras do que imaginavam.
Desde o primeiro momento, a série nos coloca no encalço de Sol, personagem de Lee Jung-Jae, que passa a investigar o assassinato de uma antiga amiga e companheira Jedi, vivida por Carrie-Anne Moss. A partir daí, somos levados em uma narrativa que ora aparenta ser de aventura, ora de suspense, mas sem decidir-se ao certo qual tom deve, de fato, assumir.
A história de The Acolyte se passa basicamente em três núcleos: o conselho Jedi, a equipe buscando a assassina e a assassina junto ao seu fiel escudeiro, sempre um passo à frente e seguindo para o próximo alvo. De bônus, um núcleo secundário mas de extrema profundidade – digna de muito mais proveito, diga-se de passagem -–é o do Coven das Bruxas de Brendok, liderado pela Mother Aniseya, interpretada pela gigante Jodie Turner-Smith.
É a partir desse planeta e da reunião das bruxas que outrora tiveram liberdade para realizar seus cultos ao Fio, conhecido por nós como a Força, que toda a história se inicia. Isso porque, em um episódio de flashback, a série nos apresenta todo o contexto de exílio e refúgio das personagens que, em busca de vida, repovoaram um planeta que em outros tempos não havia absolutamente nada. A ocupação de uma base de extração de minério como seu novo lar, já é, por si só, um ato de resistência e que “grita” com um subtexto extremamente bem elaborado.
Nesse ambiente, vemos as gêmeas ainda crianças, Osha e Mae, personagens da brilhante Amandla Stenberg, treinando suas habilidades com o Fio/Força e seguindo até o momento do rito em que serão aceitas como bruxas do Coven para que, futuramente, assumam a liderança e perpetuem seu legado. Porém, é neste ponto que os Jedis intervêm e decidem levar as crianças ao Senado, afinal, não seria possível um grupo de mulheres conceber, sozinhas, duas crianças sem a utilização de magia.
The Acolyte nos coloca diante de verdades que, talvez, não sejam das mais aceitáveis: os jedis não são os seres perfeitos que nos foram apresentados desde 1977 -– ano de lançamento do primeiro filme da franquia. A partir deste primeiro encontro dos cavaleiros com o coven, a Ordem Jedi fica envolta em uma teia de mentiras que os seguem até os eventos do presente, onde uma ex usuária do Fio/Força segue em busca de vingança.
Uma das gêmeas, Mae, assume esse cargo e segue em busca de assassinar todos os Jedis que levaram ao fim do seu antigo coven. Desta forma, ela segue sua jornada em busca de assumir o manto de acólita, uma espécie de braço direito de um Sith, posteriormente tendo sua identidade revelada como o próprio Qimir, interpretado pelo espetacular Many Jacinto.
Ao apresentar intrigas, desavenças, reencontros e inúmeras questões, The Acolyte traz à audiência novos conceitos para o universo de Star Wars. Desde o título, e sua explicação, à ideia de vergência ou um chicote de luz, tudo é, muitas vezes, novo para o grande público. E, como sempre, tudo novo é novidade.
Entretanto, ao trazer tais ideias, a série sofre por não ter solidez. A falta de fundamentação durante a temporada nos mostra que faltou convicção de que era aquilo que, de fato, desejava-se e precisava ser exibido. Não houve escassez de ousadia na construção da história, porém faltou confiança nessa ousadia.
A produção nos entrega uma história nova e ao mesmo tempo referenciando àquela que já conhecemos onde um jovem possui o equilíbrio da Força. Agora temos duas jovens, geradas pelo Fio/Força, separadas de alguma maneira, mas que se complementam. São clones gerados a partir da crença existente dentro deste universo. Porém, são dois corpos que dividem o mesmo ser.
Ao fim da sua primeira temporada The Acolyte gera muito mais dúvidas do que respostas. Afinal, durante a caminhada que levou até o fim do seu oitavo episódio, as cartas já estavam postas e muitas respostas estavam diante de nós. Porém, nos minutos finais do seu primeiro ano, fica a sensação de que acabamos de ver o prólogo e que o próximo episódio, na verdade, será o primeiro.
Com boas atuações, um visual extremamente delicado e belo, cenas de ação de primeiríssima qualidade e uma criatividade invejável, a série sofre, talvez, por ser herdeira do nome “Star Wars”. Se essa fosse uma história independente, uma produção com menor orçamento de um canal mais simples ou se não carregasse o sobrenome que carrega, talvez o sucesso fosse estrondoso. O maior problema de The Acolyte é que ela caiu na rede daqueles que zombam dos herdeiros – mas gostariam de ser um.
No fim, fica a lição de que não basta carregar um grande nome que tenha marcado gerações. Não adianta ser criativo, fazer perseguição de naves, lutar com sabre, apresentar novas ideias e até subverter os conceitos pré-estabelecidos se não houver crença naquilo que se é capaz de fazer. A ousadia não vai ser capaz de se sustentar se não houver credibilidade naquilo que se faz.
Que a Força esteja sempre conosco… Ou melhor, o Fio esteja sempre nos conduzindo por novas narrativas bem costuradas e idealizadas!
Nota: 8,63