Escrito por: Pedro Rubens
Há inúmeras produções televisivas, e até cinematográficas, que nos contam histórias onde fantasmas do passado voltam a assombrar alguém. Longe da ficção, utilizamos essa metáfora constantemente ao dizer que uma história antiga volta à tona e tenta nos assustar. Um final popularmente conhecido como desastroso pode ser esse fantasma… Mas as vezes não.
House of the Dragon, nova série original HBO, nos conta a história da Casa Targaryen e apresenta o arco da linha sucessória envolvendo a tríade Targaryen-Hightower-Velaryon. Sempre seguindo a história pelo ponto de vista das princesas Rhaenyra e Alicent, vemos os seus respectivos desenvolvimentos desde a juventude onde eram confidentes e melhores amigas, até a vida adulta onde o amor dá lugar a vingança, obsessão e maldade ocasionadas pela fome de poder.
Adaptando A Dança dos Dragões, trecho do livro Fogo e Sangue, de George R. R. Martin, a série nos leva para períodos históricos que antecedem o nascimento de Daenerys Targaryen, conhecida de Game of Thrones. O objetivo dessa volta ao passado, pincelando na juventude de duas princesas que cresceram juntas, é nos inteirar acerca dos eventos que aconteceriam quando ambas fossem adultas e costurar toda a história com a linha da maternidade e poderio feminino.
Lembrar da “série mãe”, que nos imergiu ao universo criado por Martin, talvez lhe cause arrepios na espinha principalmente diante do final que, para muitos, é considerado doloroso. Mas aqui não há espaço para que esse fantasma volte à tona, causando o mínimo de assombração sobre uma possível condução, e desfecho, ruim.
Se desde o primeiro episódio House of the Dragon já nos mostrava o nível de produção, o decorrer da temporada outorga tudo o que já estava diante do público. Seja na ambientação milimetricamente pensada, o figurino exuberante, a trilha sonora arrebatadora, direções invejáveis e o CGI assustadoramente impecável, a HBO mostrou ter consciência dos erros do passado e não jogou-os para debaixo do tapete.
Porém, de longe, o maior destaque para a primeira temporada é o roteiro e a narrativa extremamente densa, mas que flui tranquilamente tal qual o rio corre para o mar. À medida em que a produção não se fundamenta em efeitos visuais para criar dragões e fogo constantemente, mas opta por criar diálogos poderosos, levantar problemáticas que não estão distante da nossa realidade e transformar um caso claro de necessidade de terapia familiar em um espetáculo colossal.
Ainda que a constante utilização de saltos temporais tenha sido cansativa para alguns, por outro lado fica explícito que tudo aquilo fazia-se necessário para contextualização do espectador. A grande guerra civil da Casa Targaryen precisava de um contexto para existir, afinal, se as críticas são tecidas por estender incessantemente essa introdução de personagens, ou mudar suas personalidades, haveriam críticas se já caíssemos de paraquedas em meio ao caos da Dança dos Dragões.
Vale ressaltar também que de nada valeria um roteiro tão bem elaborado se não houvesse um elenco primoroso para executá-lo. Milly Alcock, Emma D’Arcy, Emily Carey, Olivia Cooke, Matt Smith, Eve Best, Rhys Ifans, Paddy Considine e Steve Toussaint são apenas alguns dos nomes que carregam nas costas o peso dos seus respectivos personagens.
Uma simples troca de olhar, a caminhada até a mesa de um jantar, as longas e dolorosas passadas até o Trono de Ferro, a canção em Alto Valiriano ou a notícia de uma perda irreparável. Nenhuma dessas cenas teria o peso que de fato tiveram se não fosse os atores que fizeram seu trabalho com tamanho amor ao ponto de não precisar texto, apenas sua entrega e devoção àquele momento.
Para que haja perfeição durante a dança, o corpo de bailarinos ensaia incessantemente. A primeira temporada de House of the Dragon termina com a sensação de um grande ensaio geral, orquestrado e rumando para a perfeita tragédia quando os Dragões começarem a dançar.
Nota: 9.55